logotipo operacional.pt

AR4, O MINI-UAV PORTUGUÊS À CONQUISTA DO MUNDO

Por • 11 Dez , 2012 • Categoria: 07. TECNOLOGIA Print Print

Quantos portugueses sabem que um AR4 “Light Ray”, de concepção e fabrico português, foi primeiro UAV (unmanned aerial vehicle) de sempre a efectuar uma demonstração de voo no prestigiado “Farnborough International Air Show” no Reino Unido?
Foi um marco na história desta fantástica mostra internacional da aviação civil e militar, mas também, sem dúvida, da aeronáutica portuguesa.

O AR4 "Light Ray", é o primeiro de uma familia de UAV portugueses que estão a chegar ao mercado.

O AR4 "Light Ray", é o primeiro de uma família de UAV portugueses que estão a chegar ao mercado.

Lançamento mundial
E tanto assim é que as razões para só agora em 2012 isto ter acontecido, tantos anos depois de andarem a voar pelos quatro cantos do mundo milhares de UAV’s, não foram propriamente obra do acaso. Bem antes pelo contrário, foi um trabalho demorado e complexo, tornando o facto ainda mais motivador para quem o alcançou, a “TEKEVER Autonomous Systems“. Nesse dia de 10 de Julho de 2012, pelas 13H00, quando o AR4 voou nos céus de Farnborough e a Tekever anunciou que o “Light Ray” estava pronto para ser comercializado, encerrava-se um ciclo de trabalho que tinha começado mais de 4 anos antes, absorvendo esta única apresentação, cerca de 3 meses de preparação intensa. Na realidade, como nos refere Ricardo Mendes, um dos administradores do Grupo Tekever, «as condicionantes que a organização do festival colocou a quem queria apresentar em voo um UAV foram de tal modo exigentes que muitos desistiram outros não foram capazes de as alcançar. Tivemos que adaptar o “Light Ray” sobretudo com modificações drásticas ao sistema de comunicações, com meses de trabalho árduo para muitos dos nossos engenheiros, mas conseguimos». É assim, com indisfarçável satisfação, que Ricardo Mendes nos mostra o vídeo da reportagem que a BBC fez deste “detalhe” do festival, o qual também motivou uma série de referências em revistas e sites da especialidade, muito significativo para a projecção internacional da Tekever, não seja Farnborough o que é no mundo da aviação.
Mas afinal o que é Tekever, o seu AR 4 e como aqui chegaram? Para responder a estas questões e outras que têm a ver com o emprego pelo Exército Português deste mini-UAV, entrevistamos na semana passada o Eng.º Ricardo Mendes, na sede do grupo, em Lisboa.
Neste artigo damos a conhecer a empresa que se dedica aos “sistemas autónomos” e acima de tudo o AR 4. Em breve esperamos poder assistir ao seu emprego com o Exército e disso daremos conta aos nossos leitores.

A sede do Grupo em Lisboa onde trabalham mais de 70 engenheiros e cujas receitas são obtidas em 80% no estrangeiro.

A sede do Grupo em Lisboa onde trabalham mais de 70 engenheiros e cujas receitas são obtidas em 80% no estrangeiro.

Espaço, Defesa e Segurança, são áreas em que a Tekever tem uma palavra a dizer no respeitante a investigação e desenvolvimento.

Espaço, Defesa e Segurança, são áreas em que a Tekever tem uma palavra a dizer no respeitante a investigação e desenvolvimento.

Tekever Autonomous Systems
Criado em 2001 a “Tekever” é hoje um grupo português com os olhos postos no mercado mundial, onde realiza 80% da sua facturação. Uma das empresas, a “Tekever Autonomous Systems”, tem como primeiro produto em fase de comercialização o mini-UAV AR4 “Light Ray”. Diz-nos Ricardo Mendes «O mini-UAV é o primeiro de uma série de produtos que estamos a desenvolver na área dos sistemas autónomos, não só aéreos como terrestres e aquáticos. Temos resultados em outras áreas do Grupo e decidimos investir nesta área dos sistemas autónomos.
Começamos por fazer o desenvolvimento do que chamamos “plataforma base”, ou seja, toda a electrónica, todo o software, toda a algoritmia, tudo o que é o “cérebro” da nossa estratégia de sistemas autónomos. Temos uma plataforma comum a todos os sistemas e que é a base dos produtos que temos e dos que iremos desenvolver nos próximos anos nesta área. O AR 4 é o primeiro que já foi lançado para o mercado, outros se seguirão. O trabalho destes últimos anos foi assim não só neste aparelho mas em todos, e mesmo neste as suas capacidades continuam em desenvolvimento, para lhe dar mais funcionalidades, tecnologias melhores, mais baratas, vamos melhorando. A “Tekever autonomous systems”, opera dentro desta área de actividade na qual há um mercado civil e um mercado militar e há ainda um segmento que é civil mas está muito perto dos militares que é o das forças de segurança por exemplo. No civil há por exemplo o de comunicação e média, no qual já se começam a ver filmagens aéreas por equipamentos deste tipo, ou ainda inspecção de infra-estruturas com sistemas laser, e veículos terrestres para inspecção de tubagens, ou aquáticos para inspecções de pilares submersos.
Dentro dos UAV o mercado mais premente é o mercado militar e assim foi aqui que começamos com um produto que pode ter uso civil mas está vocacionado para fins militares. O AR 4 está industrializado, se amanhã nos encomendarem 200, em pouco tempo os forneceremos
».

O AR4 num contentor para transporte administrativo. O transporte táctico faz-se numa mochila (100l).

O AR4 num contentor para transporte administrativo. O transporte táctico faz-se numa mochila (100l).

Para provar a facilidade de montagem do aparelho a empresa resolveu "encarregar" o Operacional - que nunca tinha visto o equipamento - de o montar...

Para provar a facilidade de montagem do aparelho a empresa resolveu "encarregar" o Operacional - que nunca tinha visto o equipamento - de o montar...

...e na realidade a junção das peças é intuitiva e não necessita qualquer ferramenta...

...e na realidade a junção das peças é intuitiva e não necessita qualquer ferramenta...

...mas também é certo que os pouquissimos minutos com que cumprimos a tarefa, teve uma ou duas "dicas", sopradas no momento certo! Seja como for, à segunda já se fazia sem ajuda, isso é certo.

...mas também é certo que os pouquíssimos minutos com que cumprimos a tarefa, teve uma ou duas "dicas", sopradas no momento certo! Seja como for, à segunda já se fazia sem ajuda, e não seria necessário mais tempo que um par de minutos ou menos, isso é certo.

Cooperação com entidades exteriores ao grupo
A empresa coopera com várias universidades e institutos de investigação sobretudo no estrangeiro mas também em Portugal, «por exemplo, o Instituto Superior Técnico, a Universidade de Aveiro, a Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto», mas são colaborações para “eixos particulares de investigação”. Não se trata de pedir o desenvolvimento de componentes para os seus produtos, isso é feito no grupo. «É antes disto, ou seja, colaboramos com entidades exteriores na investigação de tecnologias que estão “menos maduras”. Temos em curso mestrados e doutoramentos em “coisas” que não estão ainda próximas do mercado. É aqui que cooperamos com as universidades, nestas áreas exploratórias que procuram ir mais além do que aquilo que se conhece. Depois a integração disto, naquilo que nos interessa, nos nossos produtos, isso é feito por nós, é desenvolvido na empresa, por profissionais, industrializando a tecnologia de modo a servir os nossos produtos».

180 cm de envergadura, 140 cm de comprimentos e 5 Kg de peso. Capaz de transportar 2 Kg de carga, tem um alcance de 20Km e uma autonomia de 2 a 3 horas.

180 cm de envergadura, 140 cm de comprimentos e 5 Kg de peso. Capaz de transportar 2 Kg de carga, tem um alcance de 20Km e uma autonomia de 2 a 3 horas.

Ricardo Mendes mostra-nos o "gimbal", fabricado pela empresa mas que integra sensores dos mais variados, adquiridos nas firmas especializadas.

Ricardo Mendes mostra-nos o "gimbal", fabricado pela empresa mas que integra sensores dos mais variados, adquiridos nas firmas especializadas.

O Exército, parceiro no desenvolvimento
Não nascendo assim este projecto no meio militar – como o PITVANT sobre o qual já falamos nas páginas do Operacional – embora seja uma necessidade mais do que evidente em vários tipos de operações onde temos participado e uma das lacunas graves no nosso inventário (devemos mesmo ser o único país da NATO que não opera este tipo de “arma”), quisemos saber como surgiu a cooperação com o Exército Português.

Das respostas obtidas emerge também a forte convicção de Ricardo Mendes do que deveria ser a cooperação entre indústria e forças armadas em Portugal. «Quando avançamos para o desenvolvimento desta plataforma tínhamos uma ideia do que era necessário fazer, em termos de tecnologia, fruto de muita investigação prévia. Como sabemos o produto em si serve para colmatar necessidades do cliente. No caso militar elas são muito específicas e ligadas ao tipo de operações que se destinam a cumprir. Sendo no entanto certo que não há em termos de electrónica e de software base, grandes diferenças para veículos de finalidade civil, estes são é “nomeados” pelos operadores para cumprir tipos de missões diferentes.
Quando chegámos ao ponto de ter “maturidade na plataforma” e depois de já estarmos em fase de testes com o 1.º produto (o AR 4), e de ele ter passado os primeiros testes técnicos, já voava, já estava estável, portanto já bem avançado, mas isto não era ainda um produto. Faltava ser adaptado aos requisitos operacionais e técnicos do tipo de cliente que desejamos, e aqui quem precisa dele são forças que necessitem de um alcance até aos 10 a 15 km, portanto relativamente curto.
Falamos com o Exército, potencialmente quem podia necessitar mais deste equipamento – infantaria, artilharia, forças especiais, por exemplo, – e fizemos um protocolo. Em conjunto definimos os requisitos operacionais e técnicos, ajudaram-nos na adaptação do aparelho a este tipo de requisitos e depois na validação do produto. Foi um processo longo, mais de um ano, com dias e dias no campo em exercícios, em vários pontos do país, por exemplo na Brigada de Intervenção, e muitas vezes em Mafra na Escola Prática de Infantaria. Fizemos inúmeras alterações, tendo-se conseguido um produto final muito bem adaptado às missões que deve cumprir. Houve um entrosamento muito grande e uma excelente cooperação».

Em relação aos outros ramos das Forças Armadas, até pelo tipo de equipamento que é o AR 4 (com alcance relativamente “curto”, vocacionado para pequenas unidades) a cooperação já se iniciou mas está mais atrasada. «Estamos em franca cooperação com a Marinha em vários projectos de investigação – onde por exemplo a Escola Naval tem uma componente muito activa – na área dos sistemas autónomos. Com a Força Aérea já nos conhecemos bem, falamos com as pessoas que estão no projecto PITVAN da Academia da Força Aérea, temos muito interesse em colaborar e julgamos que o ramo também tem».

Uma das finalidades actuais do trabalho no AR4 (e nos seguintes UAV's da empresa) é a simplificação ao máximo do trabalho dos operadores na "ground station", das quais há duas versões, uma mais completa e outra um simples "tablet".

Uma das finalidades actuais do trabalho no AR4 (e nos seguintes UAV's da empresa) é a simplificação ao máximo do trabalho dos operadores na "ground station", das quais há duas versões, uma mais completa e outra um simples "tablet".

Durante o voo, o operador está a ver em tempo real e quer o próprio avião de acordo com as instruções recebidas pode decidir para onde vai - por exemplo seguir um alvo móvel - quer o operador pode redefinir a missão.

Durante o voo, o operador está a ver em tempo real, e quer o próprio avião de acordo com as instruções recebidas pode decidir para onde vai - por exemplo seguir um alvo móvel - quer o operador pode redefinir a missão.

Defesa e Indústria, unidos pelo interesse nacional
A convicção de Ricardo Mendes é a de que este programa dos UAV da Tekever, no respeitante à cooperação com o Exército está a correr de modo «excelente» e que «houve um entrosamento muito grande», referindo-se nominalmente a diversos oficiais de vários patamares da hierarquia, “do topo à base” (esta qualificação é nossa!), que claramente o impressionaram pelo profissionalismo e trato. E aqui, diz-nos Ricardo Mendes aquilo que muitos consideram ser o caminho – e nós também! – mas que infelizmente raramente é seguido e os exemplos históricos ou bem próximos de oportunidades desperdiçadas, e de dinheiro delapidado, abundam. «Aconteceu connosco e com o Exército aquilo que na nossa opinião devia acontecer muito mais em Portugal: as forças armadas trabalharem com a indústria não apenas enquanto cliente mas a apoiar a indústria a desenvolver produtos para a área de defesa. É isto que fazem muitos países que tem indústria de defesa. Está previsto no protocolo com o Exército uma última fase de testes do AR 4, numa força nacional destacada. Para nós isso é indispensável, o produto tem que estar tecnicamente a 100%, que já está, mas também deve estar perfeitamente integrado nas operações e é isso que ansiamos por concretizar.
As Forças Armadas são importantes para nós no desenvolvimento, no ciclo de requisitos e sua adaptação ao produto e depois no respeitante ao marketing e comercialização internacional.
Nós estamos envolvidos em vários processos comerciais no estrangeiro para colocar o nosso produto, lado a lado com firmas internacionais neste mercado que é muito concorrencial. Fizemos o lançamento para a comercialização em Julho, abrimos várias “frentes” e algumas delas estão muito bem encaminhadas. Já fizemos várias apresentações e testes para clientes internacionais em vários países. Acreditamos firmemente que não teríamos possibilidade de vencer qualquer concurso se não tivéssemos o nosso Exército como referência, como alguém que validou o produto.
O mercado português é muito pequeno, nós se estivéssemos só a contar com o mercado interno o dinheiro que já investimos – vários milhões de euros – é muito superior ao que poderíamos ter como retorno. O nosso objectivo é claramente vender para o estrangeiro e trazer o retorno financeiro para Portugal. Lá fora, para que isto aconteça, temos que ter um produto tão bom ou melhor do que os outros concorrentes (sobretudo firmas americanas e israelitas), porque somos novos no mercado, e o AR4 na nossa opinião é melhor em muitos eixos de que qualquer outro produto idêntico.
Não podemos no entanto deixar que aqui em Portugal, havendo tecnologia portuguesa, outros se instalem. Acima de tudo, como portugueses, temos que ter aquilo a que chamamos uma “base forte”, ou seja, não podemos ter os nossos concorrentes a vir vender o produto deles na nossa casa! Se isso acontecer…fechamos a porta. Nunca pode acontecer».

O "gimble" Neste momento temos sensores electro-ópticos de vários tipos (definição, zoom, HD, etc), câmaras térmicas (a conjugação de ambos) na mesma Gimbal (suporte para sensores), fabricada por nós, que é giro estabilizada, estamos integrar identificação de alvos por laser,sensores LIDAR (Light Detection And Ranging) e SAR (Synthetic Aperture Radar).

O "gimbal" do AR 4 neste momento está dotado com sensores electro-ópticos de vários tipos (definição, zoom, HD, etc) e câmaras térmicas ou a conjugação de ambos. Estão agora a integrar novas capacidades, por exemplo, para identificação alvos por laser, sensores LIDAR (Light Detection And Ranging) e SAR (Synthetic Aperture Radar).

O siatema de propulsão dos mini e micro-UAV da Tekever tem sistema de propulsão eléctrico.

O sistema de propulsão dos mini e micro-UAV da Tekever funcionam com energia eléctrica.

Quem paga?
E aqui, outra surpresa, tendo em conta o panorama nacional nas indústrias de defesa, isto não só não custa dinheiro ao erário público a desenvolver, como no final ainda há retorno – esta parte mais específica da cooperação com o Exército será abordada do próximo artigo. Ou seja, «O Grupo Tekever reinveste sempre desde 2001 todo o lucro gerado, 100%. Fundamentalmente na investigação e desenvolvimento (I&D), ou seja, as receitas de outras empresas do grupo são investidas também em proveito do desenvolvimento do AR 4. Temos ainda muitos projectos de I&D patrocinados por fundos europeus destinados à Aeronáutica, Espaço, Segurança. Somos por exemplo a entidade em Portugal que tem mais projectos de investigação na European Defence Agency. Temos também projectos com a NATO e a European Space Agency. Não tenho dúvida em afirmar que nestas três grandes áreas Aeronáutica, Espaço, Segurança, em termos de I&D, somos vistos lá fora como a entidade de referência em Portugal e lideramos vários projectos internacionais.
Em termos nacionais no QREN (Quadro de Referência Estratégico Nacional) que gere fundos (ministérios da Economia e das Finanças) destinados a fomentar a economia e a desenvolver a investigação e desenvolvimento, temos vários projectos, mas nenhum especifico para “UAV”, embora alguns tenham tecnologias que podem ser utilizadas no AR4. Por exemplo para que o AR 4 possa vir a ter capacidade de ser um “nó de comunicações” para forças em campanha.
Do MDN não recebemos quaisquer fundos, o programa dos UAV da Tekever é assim financiado por nós próprios e por fundos vindos do estrangeiro
».

Este foi o primeiro UAV da Tekever que fez muitos voos de teste mas nunca chegou à fase produção. Está hoje na sede da empresa para recordar o caminho percorrido.

Este foi o primeiro UAV da Tekever que fez muitos voos de teste mas nunca chegou à fase produção. Está hoje em exposição na sede da empresa para recordar o caminho percorrido.

Projectos futuros
Além do mini-UAV AR4 a Tekever já apresentou também em Farnborough mas em exposição estática, o AR5 “Life Ray” e, não levantando muito o véu, Ricardo Mendes lá vai dizendo que têm outros sistemas em estádios diferentes de evolução.
Sobre o AR5, trata-se de um UAV com cerca de 9 m de envergadura, autonomia até 15 horas, vocacionado para missões de longa duração como por exemplo a vigilância das áreas costeiras.
Fica-nos a certeza que os “sistemas autónomos” são uma aposta forte deste grupo português e Ricardo Mendes está optimista em relação ao futuro. Não hesita quando lhe perguntamos se está confiante nos concursos para vendas no estrangeiro que estão a decorrer: «Vamos vender de certeza!»



"Tagged" como: , , , ,

Comentários não disponíveis.